Durante o processo de validação do layout de uma linha de produtos, muitas vezes a empresa decide, sabiamente, verificar se suas orientações e direcionamentos possuem força no ponto de venda e se agradam o consumidor. Uma das ferramentas utilizadas é a pesquisa Qualy. Nestes momentos podemos ouvir sua opinião, sua conexão com a marca, a percepção das cores, das formas e dos ícones. E descobrimos que os degrades da direita para esquerda é bom num determinado projeto, mas que se inverter é muito ruim. Que a fonte do nome daquele remédio de dor de cabeça não pode mudar de jeito nenhum, muito menos a cor. Que o lencinho que envolve o sabonete em barra é importantíssimo porque as consumidoras estão acostumadas a usá-los para perfumar armários e gavetas. Que a cor dourada tem mais força no reconhecimento da marca do que as letras do logotipo. Que a imagem do prato numa travessa com fumaça em formato de coração garante o sabor especial no preparo das refeições para a família. E muitos outros comentários ricos e fundamentais para o entendimento da conexão emocional entre o consumidor e a marca.
Sabemos que precisamos preservar estes links a todo custo. Que o maior pesadelo de um relançamento é perder os vínculos com seus consumidores leais. Quando por questões de inovação tecnológica a empresa substitui uma embalagem conhecida pelo seu formato peculiar por uma outra mais moderna, mais prática, com mais área de comunicação, superior em todos os quesitos de produção, diferenciação e estocagem, e vê suas vendas despencarem porque seus consumidores não perceberam a mudança. Procuravam ainda o antigo formato, não enxergaram as novas embalagens expostas nos mesmos lugares.
O produto para o consumidor não é o que está escrito no rótulo, mesmo que mais bonito. A percepção é maior, tem a ver com a forma, o modo como acomoda nas mãos, o sentido de leitura, o movimento do abrir e fechar, a cor no formato estranho, o salivar quando visualiza a imagem do rótulo e muito mais. Nas experiências de neuromarketing já foi provado que o cérebro não enxerga o que não conhece e o que não foi experimentado, a informação que não existe no banco de memórias.
Enquanto assistia estas entrevistas com a atenção do observador técnico, analisando, decodificando as impressões dos outros, me perguntava se eu tinha alguma conexão forte com alguma marca de produto no meu dia a dia.
Nesta época eu adorava um perfume produzido por um cliente, uma empresa de vendas porta a porta, de fragrância floral deliciosa. Ganhei este perfume no lançamento da empresa. A embalagem que desenvolvemos para eles, na minha opinião, era chic, sofisticada, elegante. Todos me perguntavam se era algum perfume importado, um luxo. Gostava mesmo da fragrância de rosas que usei por quase um ano. Até que um dia, visitando o cliente reparei na vitrine que a embalagem tinha mudado. A embalagem do “meu” perfume tinha sido alterada. Naquele momento me senti como qualquer consumidor que acha que o produto foi feito exclusivamente para ele. Que a indústria sabe o que ele quer, que se preocupa com seu bem estar e com suas projeções e desejos. Me senti indignada e traída. Sem contar que o layout, para mim e apenas para mim, ficou popular, muito colorido, casual. Me revoltei. E como vingança, a única possível naquele momento como consumidora, desisti da marca. A partir daquele dia deixei de comprar e usar o tal perfume. Foi um corte drástico e necessário. Emotivamente necessário. Por mais que gostasse da fragrância não tinha mais nenhum vínculo com o que via. Este foi um aprendizado intenso para quem se achava imune a dependências emocionais com marcas e produtos.
Hoje, em cada projeto de design que participo, busco os fios de contato, os pontos de conexão do antigo para ser reconhecido no novo, o como representar evolução e modernidade do que precisa continuar conhecido. Como o cérebro só preserva as informações relevantes, precisamos considerar esta questão se queremos ser reconhecidos e lembrados como marcas presentes na vida de nossos consumidores.
Um bom exemplo foi o comentário que ouvi a algum tempo: “Aquela marca de chocolate sempre foi vermelha”. O que esta pessoa não sabia é que no projeto de reconstrução da Identidade Visual da empresa utilizamos o vermelho como a cor suporte da marca. O vermelho é uma cor emotiva, vibrante, símbolo da vida, cor do sangue, nobre, sofisticada, tradicional. O registro de memória desta cor é sempre marcante. A identificação é rápida. No caso da empresa de chocolates a alteração foi feita a apenas 5 anos. Mas para aquele consumidor sempre foi assim.