“Ei, psiu! Você sabia que seus cabelos vão ficar muito mais brilhantes? Acredite minha fórmula é infalível!”. “Bom dia, nesta hora dá uma vontade de beliscar alguma coisa não é? Bem doce! Pode experimentar, você vai adorar!”. “Olá madame. Gostaria de ter as mãos macias? Experimente o toque suave de minha embalagem soft touch. Viu como se adapta perfeitamente em suas mãos? Gosta das cores de minha aparência? Meu nome te agrada? Sugere alguma coisa? Que bom que gostou. Eu e minhas irmãs temos feito sucesso neste verão. Não tem dona de casa que resista ao nosso charme. Você vai gostar”. “Não, não vai embora não. Ainda tenho tanto para te contar… Puxa, ninguém tá a fim de falar comigo hoje. Porque será que meu discurso não está dando certo?” “Que é isso companheiro, não desanima. O vizinho ai da frente é todo moderninho mas nós somos clássicos! Todo mundo gosta de um clássico. A gente tem mais papo, mais história para contar que o pirralho da esquerda”.
É assim que imagino o esforço que as embalagens fazem para se comunicar com o consumidor que passa apressado entre as gôndolas de supermercados, lojas de conveniência, drogarias, lojinhas e qualquer outro lugar em que o produto precisa sozinho comunicar tudo o que tem de benefícios, valores, vantagens, qualidades e diferenciais. Muitas vezes num rótulo pequeno para comunicação, se trava uma batalha dura, num esforço extraordinário e desafiador de superar a concorrência em vendas. E o vencedor na maioria das vezes é aquele que conta a melhor história, que explica com mais eficiência, que se apresenta de forma mais clara, objetiva e esclarecedora. Os compradores de hoje apreciam uma história bem contada.
Os produtos se agrupam por temas a fins. É o que percebo quando passeio pelas gôndolas ouvindo o som imaginado pelo visual que se traduz em conversas interessantes. Nervosos e agitados são os limpadores e desinfetantes que prometem eficiência na limpeza das bactérias, gorduras e sujeiras invisíveis. Velocidade tecnológica é o papo mais importante entre os desodorantes. Fofura, delicadeza, cuidado e diversão nos suspiros da gôndola baby/infantil. Temperos, noodles e misturas de bolo atrapalham as dietas quando apresentam gulodices instantâneas. Biscoitos e snacks são barulhentos. Orgânicos, organizados e contidos, o peso do padrão de qualidade. Sementes não se importam. Cafés são tradicionais, conversa de fazendeiros. Sucos modernos falam a língua dos anjos. E assim durante meu trajeto muitas vozes se misturam.
Mas tem um espaço que sempre me pareceu silencioso e reservado apesar de muito visitado pelos apreciadores de vinhos. Um mundo diferente, exclusivo e especial. Conversa de gente grande onde se fala pouco, por que o mínimo é mais. Senhores consagrados, de importância e tradição. Precisei conhecer melhor este mundo para desenvolver os novos rótulos para o vinho “Original” da Vinícola Góes. O briefing era muito objetivo, desenvolver novo rótulo fazendo a transição para a nova garrafa acompanhar o padrão de mercado sem perder a conexão com o consumidor, ou seja, evoluir e se manter o mesmo. Esta tarefa pode parecer simples e de fácil execução mas quando o assunto é vinho, qualquer alteração em seu visual pode ser muito favorável ou um tanto desastrosa.
Nosso objetivo foi enobrecer o rótulo na garrafa de vidro verde de ombro marcado e corpo reto. A primeira decisão foi definir apenas um rótulo, eliminando a gargaleira e o rótulo do verso para economia de produção. O box preto com frisos dourados na parte superior do rótulo único, enobreceram e emolduraram o logo da Vinícola, lugar de origem, referencia importantíssima na categoria. O “tartin” xadrez e o brasão tradicional da marca se mantiveram, ganharam volume, cores modernas e elegantes para melhor percepção e visualização das variantes na prateleira. Um senhor de quase 70 anos que mudou o tom da conversa. Agora ele consegue se comunicar melhor com os mais jovens sem abandonar seus antigos amigos.
A cada geração é assim que as marcas se movimentam, se adaptando às novas linguagens visuais, aos novos significados, restaurando conexões, para que o diálogo entre produto e consumidor não fique mudo ou sem sentido. No silêncio não há entendimento, nem troca, nem evolução.
Rita de Cássia M. Ardezzoni – Partner e Diretora de Criação da R1234 Art Design – rita@r1234.com.br